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Mais de 150 mil ações de cobrança de dívidas dos municípios sobrecarregam Justiça no Ceará

29 de janeiro de 2020 às 09:02

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Mais de 150 mil ações estão em tramitação na Justiça do Ceará com o objetivo de cobrar dívidas ativas das prefeituras cearenses. O número se refere, principalmente, à cobrança de tributos não pagos por contribuintes às gestões municipais. Como são receitas devidas para a administração pública, os prefeitos precisam apresentar cada ação de execução fiscal ajuizada ao Tribunal de Contas do Estado do Ceará (TCE-CE); caso contrário, estão passíveis a ter contas rejeitadas.

Contudo, o ingresso de ação na Justiça não é a única maneira de comprovar a execução fiscal das dívidas. O 1º Fórum de Incremento das Receitas Municipais a partir da Desjudicialização das Ações Fiscais foi realizado ontem, em Fortaleza, com o objetivo de apresentar uma alternativa aos prefeitos cearenses para a cobrança destes valores. A ideia é evitar que as prefeituras ingressem com ações judiciais para cobrar débitos tributários em casos em que isso pode ser feito por meio dos chamados cartórios de protesto. O evento foi organizado pelo Instituto de Estudos de Protestos de Títulos do Brasil do Ceará (IEPTB-CE), pelo Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE), pelo TCE-CE e pela Associação dos Municípios do Ceará (Aprece).

 
"O cartório de protesto é uma serventia pública que recupera créditos", resume o presidente do IEPTB-CE, Samuel Araripe. "O tabelião tem a delegação de fazer a cobrança a pessoas físicas, jurídicas, públicas ou privadas", acrescenta. Araripe elenca quatro vantagens ao utilizar os cartórios para a execução fiscal: o custo, a celeridade, a segurança jurídica e a informatização do sistema.

"A Prefeitura vai cobrar a sua dívida a custo zero, não vai ter nenhuma despesa. (Além disso) Em sete dias, o processo está concluído, ou está pago ou está protestado", explica. O protesto a uma cobrança devida ao Município dura sete dias, detalha Araripe. O IEPTB recebe a demanda da Procuradoria Geral do Município e encaminha intimação ao devedor. Este terá três dias para pagar ou para oferecer um contraprotesto, caso discorde da cobrança da dívida em questão.

A agilidade permite, inclusive, um recebimento mais rápido dos recursos pela Prefeitura, do que nos casos de ações judiciais. "A ação judicial de execução fiscal é uma ação lenta, que demora muitos anos e o Judiciário já está abarrotado de processos", constata o Conselheiro do TCE-CE, Edilberto Pontes. O Tribunal foi responsável por ratificar que, em casos de protesto em cartório, os municípios não poderiam entrar na Justiça.

Desjudicialização

O presidente do TJCE, desembargador Washington Araújo, é um dos responsáveis pela mobilização para aumentar o número de prefeituras utilizando os cartórios de protesto. "Há uma eficácia maior no recebimento nos cofres públicos municipais e desafoga o Judiciário", diz. Como exemplo, ele cita o caso de Beberibe, no litoral leste do Ceará.

Segundo Araújo, o Município tem mais de 4.900 ações de execução fiscal em tramitação, o que representa 50% do acervo de processos de Beberibe. "O Judiciário, em vez de trabalhar nos processos que significam a pacificação social, resolver os problemas dos munícipes, atua como cobrador dos impostos municipais", afirma.

Outro problema para gestores em relação às ações judiciais são os gastos diante de baixos valores das dívidas cobradas. "Muitas vezes, nós temos que executar uma dívida ativa de R$ 500 e esse processo entra na Justiça e, talvez, se gaste R$ 2 mil ou R$ 3 mil só na burocracia", aponta Elmo Aguiar, prefeito de Cariré.

"Nós queremos que a execução (fiscal no Judiciário) seja a exceção. Naquele caso em que o protesto não resolveu, o valor é expressivo e que vale a pena ir ao Judiciário. Porque estão indo ao Judiciário com valores ínfimos, sendo que é possível protestar e é sem custo para o município", ressalta Washington Araújo.

Processo

A desburocratização do processo é uma das vantagens apontadas por prefeitos. "Existe, hoje, uma burocracia muito grande quando vai fazer qualquer execução fiscal", relata a prefeita de Aratuba, Maria Auxiliadora Batista.

"Temos agora essa prerrogativa dessas dívidas poderem ser cobrados por cartório. Fazendo com que isso seja mais efetivo, trazendo uma efetividade na cobrança para que o município possa receber os recursos dessa dívida ativa", complementa o presidente da Aprece, Nilson Diniz.

Para exemplificar o recebimento de dívidas por meio do cartório de protesto, Samuel Araripe cita que, entre 2016 e 2019, três procuradorias arrecadaram cerca de R$ 550 milhões em dívidas ativas. Foram elas: a Procuradoria Geral do Município de Fortaleza, a Procuradoria Geral do Estado do Ceará e a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional.

No Ceará, há cerca de 330 cartórios de protestos, com cada município tendo "praticamente dois ou três cartórios para fazer esse tipo de serviço", afirma Araripe. Apesar disso, apenas 20 dos 184 municípios já possuem convênios com o IEPTB-CE, para utilizarem os cartórios de protestos na cobrança de dívidas ativas.

Para realizar o convênio, é necessário enviar proposta à Câmara Municipal, para que o Legislativo possa autorizar o novo modelo de execução fiscal. "É preciso que o poder público possa se modernizar, dar mais eficiência, e a gente possa fazer com que o cidadão tenha a consciência de que os tributos são importantes para a entrega de serviços públicos de qualidade", conclui Diniz.

Queda de repasses preocupa prefeitos cearenses em 2020

Os atuais prefeitos cearenses finalizam seus mandatos em 2020. Por conta disso, há uma maior pressão para equilibrar as finanças das prefeituras. Não deixar dívidas para os gestores que assumirão o comando dos municípios em 2021 é um desafio, mas não o único diante da busca por equilíbrio fiscal.

Em janeiro deste ano, houve uma queda de 15,2% dos repasses no Fundo de Participação dos Municípios (FPM), uma das principais fontes de receitas para as prefeituras. O valor foi calculado pela Confederação Nacional de Municípios (CNM) fazendo a comparação com o valor executado em igual mês do ano passado. A projeção é de que, no primeiro trimestre de 2020, os repasses tenham queda de, pelo menos, 10%. 

“Nós estamos tendo uma dificuldade de repasses principalmente na área de Assistência Social e, com esse congelamento do teto de gastos, também na Saúde e Educação, sobretudo com a inflação que se tem hoje”, explica o prefeito de Altaneira, Dariomar Rodrigues. “A gente tem essa preocupação porque os municípios pequenos vivem praticamente dos repasses tanto do Governo Federal como Estadual. A situação é de apertar os cintos”, completa a prefeita de Aratuba, Maria Auxiliadora Batista. 

A indicação para ‘apertar os cintos’ foi levada aos prefeitos cearenses por meio da Associação dos Municípios do Estado do Ceará (Aprece). “Nós começamos o ano muito mal. O aviso que demos aos prefeitos é de apertar os cintos, diminuir as despesas, porque neste ano nós precisamos encerrar o ano fiscal sem dever”, ressalta Nilson Diniz, presidente da Associação. 

Um dos pontos que devem pressionar as finanças municipais é o anúncio do Governo Federal de reajuste de 12,84% para os professores. “É um aumento justo, mas não sei se vou ter o dinheiro para pagar”, relata o prefeito de Cariré, Elmo Aguiar. Ele já enviou o ajuste à Câmara Municipal, mas projeta que terá que complementar recursos para manter as contas em dia. 

Isto porque, anteriormente, todo o dinheiro para o pagamento de professores municipais e eventuais investimentos em Educação costumava ter origem no Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb). Hoje, porém, o montante não é mais suficiente. “Os professores são os mesmos e diminuiu a quantidade de alunos, sendo que a gente recebe ‘per capita’. Então, são menos recursos, e a minha despesa vem subindo. O Município começa a colocar recursos do FPM e do ICMS e de outras receitas para complementar o Fundeb”, explica Aguiar. 

O Fundo deve ser uma das pautas da próxima Marcha de Prefeitos em Brasília neste ano. A maior preocupação da Aprece é que, no Ceará, o Fundeb representa mais de 30% da receita corrente líquida dos municípios. “É muita obrigação para o prefeito. Aquele sonho que se tem de fazer coisas novas, você não consegue por conta da escassez de recursos”, diz o prefeito de Altaneira.