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Facções criminosas tentam influenciar resultados eleitorais nas 5 regiões do País, alertam autoridades

22 de setembro de 2018 às 16:12 - Atualizado em 22/09/2018 16:12

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As facções criminosas estão atuados nas cinco regiões brasileiras para tentar influenciar o processo eleitoral em pelo menos nove estados federativos, segundo documentos de autoridades estaduais e federais brasileiras e de relatos obtidos pelo Portal Uol Noticias.

Essa relação pode ser ainda maior porque, na grande maioria dos casos, as investigações sobre as tentativas das facções de se infiltrarem no mundo político são conduzidas sob enorme sigilo. De acordo com o coordenador-geral de Defesa Institucional da Polícia Federal, Thiago Borelli, o temor de que as facções influenciem as eleições nunca foi tão grande. “Nossa preocupação é maior neste ano. Infelizmente, em que pese os esforços para reprimir a criminalidade, a gente percebe que houve um crescimento no poder das facções no país”, diz Borelli.

O delegado acrescenta que as três principais preocupações das autoridades em relação à ação das facções nas eleições são: financiamento ilegal de candidatos ou partidos, candidaturas de integrantes de facções ou de pessoas ligadas a elas, e ainda a capacidade de coagir eleitores a votar em candidatos apoiados por essas organizações.

Confira abaixo um panorama do risco de influência das facções criminosas nas eleições de cada uma das cinco regiões do país­:

Sudeste

Investigadores de São Paulo e Rio de Janeiro revelaram que pelo menos 20 candidatos (dez em cada estado) são investigados por suas supostas ligações com facções criminosas como o CV (Comando Vermelho) e o PCC (Primeiro Comando da Capital). O tema é tratado com sigilo pela maioria das pessoas envolvidas nos casos.

Em São Paulo, a polícia tenta identificar os objetivos da ligação entre os candidatos com criminosos. Um dos casos que chamou a atenção dos investigadores foi a candidatura de um filiado ao PTC, partido do senador e ex-presidente Fernando Collor de Mello. Segundo promotores, ele é irmão de um rapper que mantém ligações com o PCC. Os nomes da dupla foram mantidos sob sigilo para não prejudicar as investigações.

Enquanto essas suspeitas ainda são investigadas, o MP e a Justiça de SP afirmam que já há pelo menos um caso concreto de ligação entre o PCC e a política em território paulista: Ney Santos (PRB), ex-prefeito de Embu das Artes.

Santos teve duas passagens criminais pela polícia antes de virar prefeito. Em 1999, ele foi preso por receptação e formação de quadrilha. Em 2003, por roubo a banco. Em 2005, foi solto por falta de elementos probatórios, sem nunca ter sido condenado criminalmente. Em 2009, ele se filiou ao PSC e, três anos depois, foi eleito vereador.

Em 2016, foi acusado pelo Ministério Público de integrar o PCC e de ter cometido os crimes de lavagem de dinheiro e associação ao tráfico de drogas. Mas, em outubro daquele ano, acabou eleito prefeito da cidade. Santos só assumiu a gestão municipal porque conseguiu uma liminar expedida pelo ministro Marco Aurélio Mello, do STF (Supremo Tribunal Federal).

Em 2018, porém, ele foi declarado inelegível e afastado do cargo, a partir de uma ação por abuso de poder econômico. A reportagem pediu entrevistas com o assessor de Ney Santos, mas ele não retornou. Uma desembargadora de São Paulo confirma: ainda há processos tramitando contra o ex-prefeito.

Justiça eleitoral barra candidatura de funkeiro investigado no Rio

No Rio, a situação ganha contornos ainda mais complexos porque, além da atuação de facções como o CV, as milícias representam uma ameaça já conhecida. As autoridades acompanham candidatos suspeitos de colaborarem de alguma maneira com facções e milícias. Em entrevista concedida ao UOL, o general e secretário de Segurança do Rio, Richard Nunes, afirmou que algumas candidaturas suspeitas já foram identificadas e que a intenção é impedir que políticos vinculados a esses grupos criminosos cheguem a ser diplomados.

Uma reportagem publicada pelo jornal “O Globo”, no último dia 9, revelou que as autoridades mapearam 300 pontos sob influência do tráfico ou de milícias que funcionariam como “currais eleitorais”. Em algumas dessas áreas, apenas candidatos autorizados pelo chefe do tráfico ou da milícia podem fazer campanhas. Muitas vezes, segundo a reportagem, o poder paralelo cobra taxas para que candidatos possam fazer suas campanhas nessas regiões. Além de controlar o acesso de candidatos, facções criminosas estariam tentando infiltrar pessoas ligadas a elas entre os possíveis eleitos.

Um dos candidatos já investigado por suas supostas ligações com o CV foi o funkeiro Fabiano Baptista Ramos, conhecido como MC Tikão (SD-RJ), que pretendia disputar uma vaga na Câmara dos Deputados. Nas últimas semanas, ele foi flagrado fazendo um show para um público em que havia homens com fuzis em mãos. A Polícia Civil investiga se o local era um ponto de encontro dos chefes do CV.

Durante a apresentação, o funkeiro pediu a liberdade de traficantes e cantou a música “Faixa de Gaza”, em que cita nomes de criminosos e exalta a facção. Além disso, ele também foi flagrado fazendo as letras C e V com as mãos durante o show. À polícia, o candidato disse que estava embriagado ao longo da apresentação e que não viu pessoas armadas no local. Mesmo assim, ele foi indiciado por apologia ao crime.

A exaltação do CV em suas músicas, porém, não é a única ligação entre Tikão e o CV investigada pela Polícia Civil do Rio. Em 2017, ele foi preso por suspeita de ajudar na fuga do traficante Rogério Avelino, o Rogério 157, um dos chefes do tráfico na favela da Rocinha. À época, Tikão negou envolvimento na fuga de 157. Em abril deste ano, ele se filiou ao Solidariedade. No último dia 13, a Justiça eleitoral indeferiu a sua candidatura a deputado federal. Norte: guerra de facções faz PM pedir apoio de tropas federais

Norte

Na região Norte, o Amazonas é o berço daquela que é considerada a terceira mais poderosa facção criminosa do país: a FDN (Família do Norte). Durante vários anos, o grupo comandou, sozinho, uma das principais rotas de escoamento da cocaína produzida pela Colômbia e pelo Peru: o rio Solimões. Hoje, tem rivais.

Com a prisão dos seus principais chefes, a FDN passou também a controlar os presídios do estado. Em 2017, a organização ordenou, segundo investigações da Polícia Civil, o massacre nas cadeias amazonenses que resultou na morte de 56 detentos. Documento obtido pelo UOL mostra que o temor em relação a essa guerra fez com que a PM reconhecesse que não teria condições de garantir a segurança do pleito sozinha e pedisse o apoio de tropas federais.

No último dia 10, o TSE aprovou o envio de tropas federais para 25 municípios do estado, entre eles Manaus, epicentro do comando da FDN, e Tabatinga, principal porta de entrada da droga colombiana e peruana na Amazônia.

Traficante condenado ganha cargo público e vira cabo eleitoral

No Amazonas, além dos potenciais conflitos entre facções, outra preocupação é a atuação de traficantes nas campanhas eleitorais. No mês passado, os juízes do TRE do estado ordenaram que um homem apagasse postagens em uma rede social consideradas ofensivas ao senador e candidato a governador Omar Aziz (PMN).

O internauta em questão era Carlos Condera Nascimento Filho, 35, um traficante de drogas condenado em julho deste ano e apontado pela Polícia Civil como um dos principais distribuidores de drogas nas zonas norte e leste de Manaus. Em 2013, ele foi preso pela PM. Com ele, os policiais encontraram aproximadamente 600 gramas de cocaína.

Condera foi denunciado por tráfico de drogas, mas foi solto em outubro de 2013, graças a um habeas corpus. Em maio de 2015, Condera foi preso novamente. Ele apareceu em conversas telefônicas interceptadas, com autorização da Justiça, comandando a distribuição de drogas e o recolhimento de dinheiro em bocas de fumo de Manaus.

Em um relatório produzido pela Polícia Civil, Condera, cujo apelido é “Garotinho”, é apontado como o principal “cabeça” de uma organização criminosa especializada na distribuição de drogas em Manaus. Ele foi solto novamente em fevereiro de 2016, mas continuou respondendo ao processo iniciado em 2013 por tráfico de drogas.

De chefe do tráfico a funcionário público A sorte de Condera começou a mudar a partir de outubro de 2017. Amazonino Mendes (PDT) assumiu o governo após vencer as eleições suplementares realizadas naquele ano. Dois meses depois, em dezembro de 2017, Carlos Condera foi nomeado como assessor na Sejusc (Secretaria de Estado de Justiça e Direitos Humanos).

No cargo, tinha direito a um salário bruto de R$ 4.200. Em fevereiro deste ano, Condera, que sempre teve uma vida política agitada, finalmente se filiou a um partido político. Escolheu o Solidariedade, partido presidido no Amazonas pelo ex-vice-governador Bosco Saraiva, que comandou a SSP (Secretaria de Segurança Pública) no início do governo de Amazonino Mendes com a missão de conter o avanço da FDN. Saraiva é candidato a deputado federal.

Em junho deste ano, cinco anos após sua primeira prisão, Carlos Condera foi condenado por tráfico de drogas. Sua pena foi fixada em dois anos de reclusão, mas, como o processo prescreveu, sua punição foi extinta. Em agosto deste ano, Condera pediu exoneração.

Nas redes sociais, ele posta vídeos e fotos em apoio à reeleição de Amazonino Mendes e à eleição de Bosco Saraiva. A reportagem do UOL tentou fazer contato direto com Carlos Condera e Bosco Saraiva para comentar essa reportagem. Nenhum dos três atendeu às ligações. O UOL enviou perguntas tanto ao governo do estado do Amazonas como ao comando da campanha à reeleição de Amazonino Mendes.

Por meio de nota, o governo do estado disse repudiar “qualquer tentativa de ligação do nome do governador Amazonino Mendes com o tráfico de drogas”. A nota prossegue, dizendo que “o governador sempre combateu o narcotráfico em seus quatro mandatos e que Carlos Condera não tem participação oficial em sua campanha à reeleição”.

O texto termina afirmando que “não havia impedimento legal contra a contratação de Carlos Condera”. Por telefone, o advogado de Condera, Emerson Siqueira Faria, disse que seu cliente é inocente e que não pode falar sobre as interceptações telefônicas feitas pela polícia, por se tratar de uma investigação ainda em curso.

Guerra de facções preocupa eleitores e autoridades no Acre

O Acre faz fronteira com dois importantes produtores de cocaína: Bolívia e Peru. Sua localização estratégica fez com que o estado virasse alvo da disputa entre o PCC, o Comando Vermelho e uma facção local conhecida como Bonde dos 13. Em documentos obtidos pelo UOL, juízes eleitorais do estado fazem relatos desesperados sobre o temor em relação à atuação das facções nas eleições. Em um trecho, um juiz eleitoral do município de Sena Madureira relata que a diretora de uma escola onde funciona uma seção eleitoral foi procurada por moradores da região para que uma nova seção eleitoral fosse criada no local.

O temor era de que, se uma nova seção não fosse criada, eleitores que fazem parte de uma determinada facção teriam que se deslocar a áreas controladas por grupos rivais para votar, o que poderia gerar conflitos. Em outro trecho do documento, autoridades do Acre levantam até a hipótese de que facções poderiam estar forçando eleitores a votarem para determinados candidatos. Em gravações, traficantes detalham plano de entrar na política.

Um promotor do MP-AC (Ministério Público do Acre), que conversou com a reportagem sob a condição de anonimato, revelou que intercepções telefônicas realizadas com autorização da Justiça mostraram que membros da facção Bonde dos 13 conversavam, em 2017, sobre um plano para estender seu poder à política local. “Uma das estratégias envolvia a utilização de candidaturas de pessoas ligadas à facção, mas que tivessem o nome limpo. Assim, evitariam que as candidaturas fossem impugnadas”, disse o promotor.

“Quando você tem organizações criminosas que congregam milhares de integrantes, é lógico que elas vão tentar influenciar na eleição”, acrescentou. No último dia 10, a pedido do TRE-AC (Tribunal Regional Eleitoral do Acre), o TSE autorizou o envio de tropas federais para 11 municípios do estado.

Nordeste

A região Nordeste viu seus índices de violência aumentarem na medida em que as facções criminosas avançaram sobre a região em uma disputa sangrenta por mercado e pontos de escoamento de drogas para o exterior. Há indícios também de que facções estejam tentando coagir eleitores a não votarem em determinados candidatos.

No Ceará, por exemplo, um “salve” (comunicado) atribuído ao Comando Vermelho determinou que não seriam permitidos comícios de um grupo de candidatos, entre eles, Jair Bolsonaro (PSL), nas áreas controladas pelo grupo. A mensagem fez com que o estado solicitasse apoio de tropas federais durante as eleições. “Essas facções estão se ramificando no Brasil e, claro, elas querem se fortalecer. E só há uma forma de fazer isso, que é através do aparelhamento do Estado”, afirmou o procurador-geral de Justiça do Ceará, Plácido Rios.

Gravações revelam atuação de criminosos no RN

No Rio Grande do Norte, a situação parece ser ainda mais crítica. Se, no Ceará, traficantes tentam impedir a realização de campanhas em áreas sob sua influência, no estado vizinho, os traficantes querem infiltrar criminosos na política local. Interceptações telefônicas feitas pelo MP-RN (Ministério Público do Rio Grande do Norte) com autorização da Justiça, em 2016, captaram conversas entre dois suspeitos de integrarem a facção Sindicato do Crime, uma das mais fortes do estado. Alan Marcos Zico Fonseca, conhecido como Alan Bigodinho, sugere a Raimundo Kleber Benicio da Costa, o “Cego de Santa Cruz”, que a organização deveria infiltrar alguém na política.

O colega dá risada e diz que isso estava sendo providenciado. Ele conta que, durante as eleições daquele ano, foi procurado por um candidato a vereador do município de Santa Cruz (a 117 quilômetros de Natal) pedindo autorização para ingressar em uma área controlada pela facção para “comprar votos”:

Allan Bigodinho: Sabe o que era para nós ter feito? Era pra ter infiltrado um pessoal nosso nessa política aí.

Cego de Santa Cruz: (risos) Mas está tendo. Tem um lá na Santa [município de Santa Cruz]. Quem ligou pra mim foi Edu. Ligaram pra mim, tá ligado? Os meus vaqueiros é que foram lá, entendeu? Os vereador (sic) que pediram pra subir lá, pra comprar votos, entendeu?

Allan Bigodinho: Demorou…

Cego de Santa Cruz: Aí disse que, se ele ganhar, ele disse que fortalece lá a quebrada. Ele disse: “pode deixar que, se eu ganhar, eu tô lá por vocês”.

O candidato em questão não chegou a ser identificado pelos investigadores. “Não conseguimos identificar de quem é que eles estavam falando”, afirma uma fonte ouvida pelo UOL. “Não sabemos, por exemplo, se essa pessoa foi ou não eleita.” Voto perigoso “A gente teme que possa haver conflitos violentos se eleitores identificados como de uma determinada facção forem votar em áreas controladas por grupos rivais. Isso é muito grave e pode colocar em risco a vida de outras pessoas”, afirma a mesma fonte, que disse também que ainda não foram encontrados indícios claros de que as facções que atuam no estado estejam tentando infiltrar criminosos na política neste pleito.

Um relatório produzido pelo MP-RN indica que 33 dos 167 municípios do estado estão sob influência de facções como Sindicato do Crime e PCC. O TSE autorizou o envio de tropas federais para 97 municípios potiguares. Ainda não se sabe a quantidade de militares que será deslocada. A reportagem tentou contato por telefone com os advogados de Alan e Raimundo com base no CNA (Cadastro Nacional dos Advogados) mantido pela OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), mas até a última atualização desta reportagem, as ligações não haviam sido atendidas.

Centro-Oeste

No Centro-Oeste, um dos estados que inspiram maior preocupação é Mato Grosso do Sul, que faz fronteira com a Bolívia e o Paraguai, grandes produtores de cocaína e maconha. A facção predominante na região é o PCC. A tentativa de influência do narcotráfico na política é assunto tratado com receio por juízes e promotores responsáveis pelas eleições.

A maioria deles evita falar sobre o tema publicamente. “Não dá para falar sobre esse tipo de assunto por telefone. A gente vive numa situação muito complicada aqui”, disse um promotor procurado pela reportagem. “A nossa preocupação com isso é enorme. Nós temos a maior facção do Brasil atuando aqui. Não temos como subestimar isso”, afirmou o procurador-geral de Justiça de Mato Grosso do Sul, Paulo Passos.

Passos afirma que as equipes de inteligência do MP-MS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul) estão fazendo um mapeamento das candidaturas possivelmente vinculadas a facções, mas, como os casos ainda tramitam em sigilo, mais informações não poderiam ser divulgadas.

Uma fonte que falou ao UOL sob a condição de anonimato e que mora em Ponta Porã, na fronteira entre o Brasil e o Paraguai, diz que uma das principais preocupações das autoridades locais é com uma prática antiga naquela região: a compra de votos de eleitores brasileiros que moram do outro lado da divisa.

“Muitos eleitores brasileiros moram em Pedro Juan Caballero [no Paraguai]. É muito comum que os candidatos comprem esses votos e transportem esses eleitores no dia da votação de um país para o outro. A questão é: de onde vem esse dinheiro?”, afirma a fonte, que aponta o tráfico de drogas como uma das principais fontes de renda na região.

O temor em relação à compra de votos em solo paraguaio foi reportado ao TRE-MS (Tribunal Regional Eleitoral de Mato Grosso do Sul) por juízes eleitorais que atuam na região, como mostra um documento obtido pelo UOL.

Sul

A reportagem do UOL conseguiu apurar que, pelo menos no Rio Grande do Sul e no Paraná, existem investigações em curso apurando a tentativa de infiltração de criminosos nas eleições deste ano. “A presença do crime organizado na política já é um fato consolidado. Já existem, inclusive, afastamentos determinados pelo Poder Judiciário de agentes políticos com envolvimento com o crime organizado”. A afirmação é do desembargador José Laurindo de Souza Netto, professor e supervisor pedagógico na Escola da Magistratura do Paraná.

Segundo o desembargador, há casos sendo investigados em que políticos receberiam “mesada” de facções e outros políticos que atuariam junto à população carcerária, pedindo votos de familiares prometendo ajuda. Souza Netto aponta que há interceptações telefônicas feitas com autorização da Justiça que demonstram o interesse das facções em atuar nos bastidores da política.

“Há gravações em que líderes do PCC falavam sobre a intenção da facção de se infiltrar na política. Inclusive aqui no Paraná, onde é um fato consolidado”, acrescenta o desembargador. No Rio Grande do Sul, entre as sete facções regionais, muitas são aliadas ou inimigas das duas maiores do país, PCC e CV. E essas menores também têm poder de fogo, segundo investigações.

O Sul do país convive com a ameaça do PCC, muito forte no Paraná, e com os conflitos entre grupos de traficantes regionais, segundo o FBSP (Fórum Brasileiro de Segurança Pública). Ao todo, dez facções criminosas espalhadas por Paraná, Rio Grande do Sul e Santa Catarina disputam entre si o domínio do tráfico. No Rio Grande do Sul, fontes apontaram que há pelo menos um caso em andamento que apura o envolvimento entre traficantes e políticos.

A investigação ocorre em uma cidade da região metropolitana de Porto Alegre. “Essa investigação é referente a um advogado que faria uma ponte entre o crime organizado e a Câmara Municipal de uma determinada cidade”, disse à reportagem o delegado Emerson Wendt, chefe da Polícia Civil gaúcha, que, por motivos de sigilo, não pode fornecer mais detalhes sobre o caso.

Por que as facções querem o poder político?

Para os pesquisadores Bruno Paes Manso (USP) e Julita Lemgruber (Universidade Cândido Mendes), a busca por poder político é uma forma de esses grupos manipularem recursos do estado para beneficiar as atividades ilícitas praticadas por elas. “Toda organização criminosa vai tentar se aproximar do estado para continuar operando.

Durante muito tempo, isso aconteceu a partir do suborno, do chamado arrego a policiais, fiscais, etc. Agora, essas facções estão com muito mais dinheiro em caixa. Essa disponibilidade de recursos dá muito mais poder e permite que eles tentem ingressar na vida política para ter ainda mais acesso ao estado”, avalia Paes Manso. “Uma coisa é você ter acesso ao policial. Outra coisa é ter acesso ao mundo político. É uma outra instância de poder. A gente percebia isso com relação às milícias no Rio. Imagina o que é ter um miliciano político impondo a sua vontade sobre a polícia numa determinada área. É muito mais grave”, concorda Julita Lemgruber.

O procurador-geral de Justiça de Mato Grosso do Sul, Paulo Passos, lembra que ocupar espaços no mundo político também permitiria aos criminosos controlar ou influenciar a formulação de leis e políticas públicas. “Ao final, é na política que são definidas as leis e a forma como o estado vai implementar suas políticas de segurança, por exemplo. Ter controle sobre essa esfera de poder é importante”, afirma. Bruno Paes Manso diz que ainda é cedo para dizer que o Brasil está no nível do que estudiosos chamam de “narco-estado”, nações com instituições gravemente afetadas pelo poder do narcotráfico, mas diz que o avanço das facções criminosas na vida política do Brasil liga o sinal de alerta. “É preciso repensar a forma como se dá o combate a essas facções”, opina.

Com informações do Portal Uol Noticias