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Em uma escola na Jamaica, professores revelam como surgiu a lenda Usain Bolt

Redação Folha Vitória

Kingston - O jamaicano Usain Bolt faz do atletismo um espetáculo. Deixa o público boquiaberto com sua velocidade quase sobrenatural, característica que fez do raio a sua marca registrada, e ganha a empatia dos fãs com atitudes irreverentes. O astro de 29 anos interage com as câmeras, faz caras e bocas, dança, brinca e interpreta nas pistas, compartilhando com o mundo a essência do garoto que cresceu em Trelawny.

"Usain não mudou, ainda é um menino. Ele cresceu fisicamente, sim, e emocionalmente também. Mas ainda gosta de coisas de adolescentes, ama comer nuggets de frango e jogar videogame. Ele diz que pensa nos jogos de videogame quando está na linha de largada", contou Webster Thompson, professor sênior da escola William Knibb Memorial, onde Bolt estudou dos 12 aos 17 anos.

O jeito brincalhão do velocista de 1,96 metros de altura também está vivo na memória de Lorna Jackson, que deu aulas de espanhol para o astro e atualmente ocupa o cargo de vice-diretora da escola. "Ele sempre foi alto e vinha por trás da gente e cutucava a nossa cabeça", relembrou. Dentro da sala de aula, ela admite que o menino Bolt não mostrava interesse pelo idioma estrangeiro.

Segundo a dupla, ele era um aluno dentro da média e não precisava de reforço fora do período escolar, das 8 horas às 14h30. E isso era uma condição intrínseca para que também pudesse se dedicar ao esporte. "Dizemos para todos os alunos que eles são estudantes primeiro e atletas posteriormente. Não temos dificuldade em tirá-los da equipe se o desempenho acadêmico não for bom o suficiente", explicou Thompson.

A rigidez vem da origem do sistema educacional inglês, em vigência na Jamaica. Brigas, drogas e desacato aos professores são motivos para detenções no país. Além disso, os alunos da escola William Knibb Memorial usam uniformes e não podem exibir tatuagens e joias.

A ajuda extra dos professores era oferecida apenas quando ele precisava dedicar algumas horas a mais aos treinos da equipe de atletismo. A competitividade sempre foi ferrenha entre os velocistas jamaicanos de todas as idades. Desde cedo já era sabido que Bolt tinha potencial, mas o limite de seu imenso talento ainda era desconhecido.

"Quando ele veio à William Knibb, fomos informados de que havia alguém com um talento especial. Mas nós não tínhamos ideia de quão vasto o seu talento se tornaria. Nem o próprio Usain sabia", disse Lorna.

O responsável por "lapidar o diamante bruto" que era Usain Bolt foi Pablo McNeil, ex-atleta olímpico. Mas a história do garoto com o atletismo começou ainda na escola primária, chamada Waldensia. Na época, a paixão pelo críquete falava mais alto. O estímulo para mudar de rumo veio aos 7 anos, a partir de uma aposta feita pelo reverendo Devere Nugent. Sempre atrás do colega Ricardo Geddes, Bolt ganharia um almoço de graça se pudesse vencê-lo. O incentivo deu resultado e ele deliciou-se com a refeição. Foi essa a origem de uma filosofia que o multicampeão olímpico e mundial sustenta até hoje: uma vez que eu te supere, você nunca mais me derrotará.

Na ocasião, ele ainda viu a possibilidade de ter retorno a partir do próprio esforço e aproveitar melhor a vida. Dessa forma, passou a investir mais energia no atletismo.

Bolt continua sendo estimulado por apostas com os colegas. Quem adivinhasse ou chegasse mais próximo do tempo que ele correria na prova dos 100 metros no Mundial de Berlim, em 2009, ganhava a brincadeira. O investimento foi de 100 euros para cada participante. Para desgosto do corredor, que cravou o recorde mundial (9s58), Daniel Bailey, da Antígua e Barbuda, levou a melhor.

LEGADO - A lenda do atletismo é um "talismã" para o colégio. Bolt é visto pelos alunos do William Knibb como um exemplo de que não há limite ao alcance de um sonho. É isso que o jamaicano tenta passar aos estudantes quando visita o local. Ele também ajuda com recursos materiais, como a doação de um ônibus escolar. Além disso, o contrato do velocista com sua fornecedora de material esportivo tem uma cláusula que exige a doação de uniformes para a equipe de atletismo da escola todo ano.

O mais novo projeto é a reforma do local de treinamento. Serão investidos 10 milhões de dólares jamaicanos (cerca de R$ 260 mil) na criação do clube Be a Bold Bolt Believer (seja um corajoso seguidor de Bolt, em tradução livre). A inauguração está prevista para setembro deste ano. "Bolt é um tesouro para a Jamaica. Nós o compartilhamos com o mundo e também devemos dividir a escola", exaltou Webster Thompson.

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